terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Luto] O adeus a Heloísa Juaçaba, grande dama da arte do Ceará

O Ceará perde Heloísa Juaçaba, pintora, produtora e protagonista de destaque nas artes cearenses ao longo dos últimos 50 anos


Heloísa em foto do ano passado: uma líder do mundo artístico.
Foto: Kleber A. Gonçalves - 7/2/2012
Em 87 anos de vida, Heloísa Juaçaba ajudou a dar contorno à história das artes no Ceará. Pintora, desenhista, tapeceira, escultora e gestora cultural, a mulher que era referência de pioneirismo e dedicação à arte cearense morreu na noite da última terça-feira. Dona de obra cheia de referências à cultura nordestina, Heloísa Juaçaba se recuperava de uma pneumonia desde maio deste ano. Ela morreu na própria residência e seu corpo foi enterrado ontem à tarde no Cemitério São João Batista.
“Ela se foi de morte natural, com lucidez e de modo suave, assim como viveu. A idade estava avançada e ela estava sendo cuidada em casa desde que teve uma pneumonia e ficaram as sequelas”, afirma Lúcia Galvão, jornalista e grande amiga de Heloísa. Lúcia conta que a artista se manteve “falando bem e com clareza”, inclusive, durante o último encontro das duas, no sábado passado. “Ela falava muito na vida, da pressa do dia-a-dia, de como a vida da gente se desenvolve e depois para. Mas sempre falando em vida. Morte era uma palavra que não existia no vocabulário dela”.
Incentivadora
Cearense natural da Serra de Guaramiranga, Heloísa Jaçuaba é destaque nas artes plásticas cearenses desde a década de 1950, quando iniciou carreira na Sociedade Cearense de Artes Plásticas (Scap). Além de passear com maestria por muitos movimentos como abstracionismo, construtivismo, cubismo e de ser dona de considerável capacidade de cruzar linguagens artísticas, ela foi também importante incentivadora dos artistas e dos espaços culturais no Ceará.
A artista fundou, em 1967, o Centro de Artes Visuais, depois chamado de Casa de Cultura Raimundo Cela, onde foi diretora por oito anos. Esse espaço serviu como escola de arte para nomes como Sérgio Lima, Roberto Galvão e Descartes Gadelha. Além disso, Heloísa participou da fundação do Museu de Arte da UFC, da organização do Museu de Arte e Cultura Populares do Ceará, para onde doou 920 peças do seu acervo particular. A artista foi também membro do Conselho Estadual de Cultura, diretora do Departamento de Cultura da Prefeitura de Fortaleza e coordenadora no Ceará do Sistema Nacional de Museus.
“Ela era uma pessoa muito abnegada, fazia muito pelos artistas daqui. Ela ajudou muita gente e fazia isso naturalmente, era dela ser assim. Gostava muito dos artistas e queria ver o progresso deles. Ela era empenhada e muito sensível a temas culturais”, conta Lúcia Galvão, afirmando que ela impulsionou muitos movimentos artísticos no Estado.
Heloísa participou de muitas mostras coletivas e individuais, sendo, muitas vezes, premiada. Ela expôs no Salão de Abril por vários anos desde 1953, no Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará (Mauc), no Espaço Cultural Correios, no Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, na Bienal de São Paulo, na Galeria de Arte Vicente Leite e em muitos outros espaços.
Família e liberdade
Antes da exposição no I Salão dos Novos, em 1952, que marcou a estreia da artista. Heloísa havia chamado atenção da família ao desenhar retrato da mãe, dona Hermínia, relevando um talento em comum para as artes plásticas. Ela, porém, só se tornou artista na 
fase adulta. 
Mãe de cinco filhos, Heloísa foi artista em época que a presença das mulheres nas artes ainda não eram tão comum. Ela não só produziu como trabalhou para difundir e divulgar a arte local. Do marido, o médico Haroldo Juaçaba recebeu os primeiros pincéis e telas e o apoio necessário para a carreira. 
Em entrevista ao O POVO, em junho de 2010, a artista falou sobre a importância da relação familiar com a obra dela. 
“Sempre gostei muito de liberdade, fui criada entre isso. Fui a última de nove filhos e quando eu era moça, mamãe levava muito para passear”, disse a artista.
E foi recorrendo à arte moderna como expressão de liberdade que Heloísa Juaçaba se manteve mais de 60 anos produzindo, discutindo, defendendo e divulgando arte.
Repercussão
“A despedida de Heloísa Juaçaba entristece o Ceará e o Brasil. Ao longo de sua vasta trajetória, ela deixou um inestimável legado no desenho, na pintura, na escultura, com uma sensibilidade especial para os temas do Nordeste. Devem ser sempre lembradas sua marcante atuação na Sociedade Cearense de Artes Plásticas e sua importante contribuição como gestora cultural. O Ceará lamenta a perda de uma de suas grandes tradutoras”. Paulo Mamede, secretário de cultura do Ceará 
“Dona Heloísa Juaçaba era uma querida, na acepção maior e mais forte que essa palavra pode ter. Era uma figura cujo talento principal estava na arte da generosidade. Dona Heloísa soube, como poucos, criar e fomentar a criatividade alheia. Foi uma incansável batalhadora pela construção de um Ceará mais colorido e possível aos artistas. Em vida, tornou-se uma referência e assim merece ser lembrada”. Magela Lima, secretário de Cultura de Fortaleza
“A Heloísa tem grande importância por sua atuação em diversos setores da cultura. Na implantações de museus - como o Museu Dom José, em Sobral; e o Museu Sacro de Aquiraz -, enquanto produtora cultural e enquanto artista. É da 2ª geração da Scap, foi uma das introdutoras do cubismo e do construtivismo no Ceará. Contribuiu com inovação significativa para as artes, foi pavimentadora,  sedimentadora e divulgadora”. Roberto Galvão, artista plástico
“A minha declaração só pode ser de pesar pela morte de Heloísa. Ela, que muito trabalhou pela arte no Ceará, foi uma protetora de jovens artistas que entravam no ramo, foi patrocinadora do Centro de Artes Visuais de Fortaleza e fez um movimento renovador da arte no estado. Perdemos uma pessoa de grande importância no movimento artístico que, além das qualidades pessoais, como a solidariedade com as pessoas, patrocinou fortemente as artes”. Estrigas, artista plástico
(Colaborou Andressa Bittencourt/Especial para O Povo)

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